quarta-feira, 18 de maio de 2011

O último adeus

Enquanto o homem da meia-noite aguarda diante da encruzilhada, eu me preparo para a batalha final, quando preciso me despedir da estrela. Nada mais justo do que tudo acabar onde começou. Por um bom tempo ela ofereceu seu brilho para mim, iluminando meu caminho, todas minhas ações. Ela não podia dar todo seu brilho, mas eu queria mais e mais, tamanho é o meu vazio. Peguei tudo o que podia e exauri seu brilho até que ele não era mais suficiente. Agora eu lembro do rosto dela, sem vida na minha frente, sem nada mais a oferecer. Eu estava vendo ela pela primeira vez em um bom tempo, então tentei esconder o que tinha visto, mas como sempre ela enxergou por dentro da minha armadura, assim como eu consigo ver através da armadura dela. Vejo agora que o que eu vi foi sua queda, caindo por minha causa, e eu não consegui suportar a culpa, por isso mandei ela embora. A culpa e a descoberta de que ela não brilharia mais. Ela estava diante de mim, como esteve tantas outras vezes, mas dentro da armadura não havia mais nada. Ela se tornou um casco vazio e a lembrança do seu brilho tornou insuportável aceitá-la daquela forma. Então comecei a afastar ela de mim de todas as maneiras, ignorando seus apelos, até partir seu coração, sabendo que ela jamais me perdoaria. E quando tentei chamar ela de volta já era tarde demais. Meu único consolo é que longe de mim ela pode brilhar de novo, porque eu não vou estar por perto para roubar o brilho, exigindo toda sua atenção. Dei a ela meu último adeus e fui me juntar ao homem da meia-noite. Eu conhecia seu reino de longe, mas nunca havia entrado nele, tampouco me imaginava no papel de vilão. Era por mim que ele chamava, aquele que o aprisionou tanto tempo atrás, finalmente desmascarado diante dele, caído aos seus pés e implorando por perdão. Mas logo o pedido passa a ser por punição, pelo que fiz a ele e a estrela, qualquer coisa para aplacar minha culpa. Mas a única coisa coisa que ele me oferece é a rosa mais vermelha que eu já vi. Eu fico em pé e pego a rosa com as duas mãos, maravilhado, então vejo toda uma plantação de rosas ainda miúdas, trazendo um pouco de cor àquele mundo tão negro. Muito pouco para um reino, mas melhor do que nada. Dou um beijo na rosa, aquele que nunca pude dar na estrela, e respeitosamente coloco ela num altar. Agora tenho uma cabana no reino despedaçado e a única coisa dentro dele é a rosa no altar. Do lado de fora está o homem da meia-noite, cuidando das rosas miúdas, finalmente achando uma razão para existir. O garotinho observa a estrada e faz companhia aos fantasmas. Quanto a mim, passo todas as noites observando o céu, procurando minha estrela. Mas toda noite vejo um céu negro e sem vida. Toda noite dou meu último adeus.

"Adeus, meu amor. Desculpa."

3 comentários:

Diário De Um Dedinho disse...

"Ele com certeza a amava. Esse pensamento a tornava mais inclinada a perdoá-lo. Era culpado, totalmente culpado (...) Mas se a machucara com certeza o mal que havia feito a si mesmo era muito maior. Ela, por sua vez, se recuperaria com o tempo, grande curador de corações sofredores."
Jane Austen

Brizola disse...

Adorei a frase!

Diário De Um Dedinho disse...

Q CADA PALAVRA PASSE A CORRER EM SUAS VEIAS...